HOMENAGEADAS
ADÉLIA SAMPAIO
Adélia Sampaio, a primeira mulher negra a dirigir um longa-metragem no Brasil, é nossa a grande homenageada na Mostra Audiovisual em 2024, na edição número 13 do Seminário Internacional Fazendo Gênero.
Filha de empregada doméstica, Adélia teve um início de vida difícil e chegou a ficar afastada de sua mãe durante a infância, e foi criada em um asilo, porque o salário que sua mãe recebia não era suficiente para sustentá-la. Aos 13 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro com a família para morar com sua irmã, que trabalhava em uma empresa que distribuía filmes russos. Lá, pela primeira vez, ela entra em uma sala de cinema e assiste Ivan, o Terrível de Serguei Eisenstein.
A partir dessa experiência, Adélia buscou trabalhos em agências cinematográficas e no fim da década de 1960 foi trabalhar como telefonista na Difilm, distribuidora brasileira ligada ao Cinema Novo. Começou a organizar o cineclube da empresa, que projetava filmes em 16mm. Passou a trabalhar também na produção dos filmes, em diversas funções. Foi continuísta, maquiadora, câmera, montadora e produtora. Sua primeira experiência em um set foi como continuísta de um filme de Pedro Carlos Rovai. Adélia foi pioneira na cinematografia negra brasileira, vivendo em um ambiente patriarcal, branco e elitista. Estreou como diretora em 1979, com o curta-metragem Denúncia Vazia.
Em 1984 lançou seu primeiro longa-metragem, Amor Maldito, do qual também foi roteirista (com José Louzeiro) e produtora. O filme estreou pouco tempo depois em algumas salas de cinema de São Paulo, com alerta de censura para menores de 18 anos.
Apesar de não ter divulgação, o longa foi um sucesso, passou a ser exibido no Rio de Janeiro, ganhou público e viajou para Festivais Internacionais. Em 2018 Amor Maldito foi exibido no FIM CINE (Festival internacional de Mulheres no Cinema e na Mostra Diretoras Negras no Cinema Brasileiro.)
O filme inaugura a temática lésbica no cinema brasileiro, contanto a história real de amor entre duas mulheres que pela falta de aceitação, resulta no suicídio de uma delas enquanto a outra é acusada de sua morte. Apesar de baseado em um fato verídico, como a maioria de seus filmes, Adélia conta que na época a Embrafilme recusou seu filme dizendo que “Jamais financiaria tal aberração”. No auge do movimento Pornochanchada, ela enfrentou o preconceito da indústria e teve que lançar seu longa travestido pelo gênero. Devido a essa falta de apoio estatal, a produção do filme se deu através de parcerias, o que o tornou o primeiro longa metragem em estado cooperativo da época.Assim, atores e técnicos recebiam uma ajuda de custo e uma porcentagem do filme.
Dirigiu em 1987 o documentário Fugindo do Passado: Um Drink para Tetéia e História Banal, sobre a Ditadura Militar no Brasil. Em 2001, dirigiu o longa AI-5 – O Dia Que Não Existiu, em parceria com o jornalista Paulo Markun. Essa produção evidenciou a proximidade de Adélia com a oposição à Ditadura.
Em 2018 dirigiu O Mundo de Dentro, que estreou no Festival Internacional de Curtas Metragens de São Paulo.
Fonte informada pela Adélia: wikipedia.
Imagem: Retrato de Adélia Sampaio. Denuncia.
Filmes exibidos (ficarão a disposição da mostra por 24 hrs a partir do início da sessão):
Denúncia Vazia
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Ano de produção: 1979
Duração: 7 min.
Sinopse: Baseado em uma história real, o curta mostra um casal de idosos que, sem recursos para o aluguel de outro apartamento, resolvem suicidar-se após receberem uma intimação de despejo.
Adulto Não Brinca
Adults Don’t Play
Ano de produção: 1980
Duração: 8 min.
Sinopse: A tradição da malhação do Judas num subúrbio. O boneco é colocado na rua como um cadáver e um bando de crianças se vê às voltas com as consequências dessa inovação.
Amor Maldito
Cursed Love
Ano de produção: 1984
Duração: 1h15min.
Sinopse: O filme se passa no Rio de Janeiro na década de 1970 e conta a história de um romance proibido entre duas mulheres, Sueli (Wilma Dias) e Fernanda (Monique Lafond), em plena ditadura militar. Sueli se suicida e, após a tragédia, Fernanda é acusada de ter matado a companheira.
Scliar: A Persistência da Paisagem
Scliar: The Persistence of the Landscape
Ano de produção: 1991
Duração: 16 min.
Sinopse: Documentário sobre Carlos Scliar, um pintor do mundo, mergulhado no tempo de seu silêncio. Tudo que o artista buscava trazer para a pele e o coração de sua pintura é a vibração interior de cada habitante do mundo. A vibração cromática não vem das tintas e sim da terra que colhe a cada lugar que visita. Scliar usava terra para dar cor às suas telas.
O Mundo de Dentro
The World Inside
Ano de produção: 2018
Duração: 8 min.
Sinopse: O curta-metragem aborda a geração dos anos 1960, especialmente o abalo causado pelos casos de Aids que começaram a surgir no período pós-ditadura.
Olhar dos Anos 60
60s look
Ano de produção: 2023-2024
Duração: 5 min.
Sinopse: Uma geração alegre, inquieta e enérgica, que protagonizou muitas revoluções e movimentos de contracultura, devastada pela ditadura militar e pela AIDS.
LUCIA MURAT
Lucia Murat é nossa a grande homenageada em 2021. A cineasta, ao longo de sua trajetória de quase quatro décadas, tem abordado questões que discutem as lutas de mulheres em suas obras, nos contextos mais variados. Nesse sentido, a atuação de mulheres na militância política em defesa da democracia no país assume papel importante em algumas de suas criações. Murat iniciou a carreira como jornalista para veículos de comunicação do Rio de Janeiro. Em 1971 foi presa e barbaramente torturada. As lembranças dos porões da ditadura foram exploradas em seu longa-metragem de estreia Que bom te ver viva, de 1989, premiado nos festivais de cinema de Havana, do Rio de Janeiro e de Brasília.
Em 2013, a cineasta prestou depoimento para a Comissão da Verdade em que descreve com detalhes as torturas sofridas durante a prisão, apontando o nome dos torturadores. Esse depoimento foi considerado fundamental para a conclusão do relatório.
As temáticas da luta social e resistência indígena também constituem pontos importantes em suas obras, haja vista a produção de longas como Brava gente brasileira (2000); Maré, nossa história de amor (2007); A nação que não esperou por Deus (2015); e Ana (2020) – além da série documental Vestígios do Brasil (2019).
Essa trajetória de lutas políticas e sociais, além das brilhantes produções cinematográficas, fizeram de Lucia Murat uma grande referência do cinema brasileiro. Ao lado de Tizuka Yamasaki – homenageada na edição da Mostra Audiovisual do Fazendo Gênero 10 – e Suzana Amaral, e muitos anos após os filmes de Cléo de Verberena, na década de 1930, a cineasta carioca é pioneira entre as mulheres no campo cinematográfico do país.
Podemos conferir um pouco de sua história nos filmes e na conversa que serão apresentados no decorrer da programação da Mostra Audiovisual. Que bom te ver viva (1989) apresenta as memórias de uma mulher presa e torturada durante a ditadura militar no Brasil. A trama é entrecortada por depoimentos com histórias reais de oito mulheres que passaram por essa situação no período. Temática que é retomada em A memória que me contam (2012), em que a morte de uma personagem reúne antigas/os amigas/os, ex-militantes que entraram em combate com o regime institucionalizado após o golpe de 1964. Por fim, o filme Em três atos (2015) intercala ficção e não ficção ao criar uma narrativa sobre o corpo, contrapondo juventude e velhice, através da dança. Trata-se da proposta de um ensaio poético com a reprodução de textos de Simone de Beauvoir.
Filmes exibidos (ficarão a disposição da mostra por 24 hrs a partir do início da sessão):
Exibição: 1º de março às 19h pelo canal do NAVI Ano: 1989 O filme aborda a tortura durante o período de ditadura no Brasil, mostrando como suas vítimas sobreviveram e como encaram aqueles anos de violência duas décadas depois. “Que Bom Te Ver Viva” mistura os delírios e fantasias de uma personagem anônima, interpretada pela atriz Irene Ravache, alinhavado os depoimentos de oito ex-presas políticas brasileiras que viveram situações de tortura. Mais do que descrever e enumerar sevícias, o filme mostra o preço que essas mulheres pagaram, e ainda pagam, por terem sobrevivido lúcidas à experiência de tortura. Para diferenciar a ficção do documentário, Lúcia Murat optou por gravar os depoimentos das ex-presas políticas em vídeo, como o enquadramento semelhante ao de retrato 3×4; filmar seu cotidiano à luz natural, representando assim a vida aparente; e usar a luz teatral, para enfocar o que está atrás da fotografia – o discurso inconsciente do monólogo da personagem de Irene Ravache. Créditos – Montagem: Vera Freire – Fotografia: Walter Carvalho – Som direto: Heron Alencar – Diretor-assistente: Adolfo Orico Rosenthal – Direção de produção: Kátia Cop e Maria Helena Nascimento – Cenografia e figurino: Beatriz Salgado – Música original: Fernando Moura – Trilha sonora: Aécio Flávio – Roteiro, e direção e produção executiva: Lúcia Murat – Distribuidora Nacional: Taiga Filmes e Video – Distribuidora Internacional para os EUA: Woman Make Movies. |
Exibição: 14 de março às 19h pelo canal do NAVI Atores: “Em três atos” se insere no quadro de um filme entre a ficção e a não ficção, uma proposta de ensaio poético que vem explodindo no cinema mundial. O limite cada vez mais tênue entre ficção e documentário vem permitindo que se trabalhe sem enquadramentos preconcebidos. O filme trata de finitude e continuidade, velhice e juventude trabalhando com o corpo, através da dança contemporânea e com a palavra, em textos de Simone de Beauvoir. A dança, coreografada por João Saldanha, é ao mesmo tempo uma homenagem a Angel Vianna, um ícone da dança contemporânea brasileira, que participou do filme aos 85 anos. Angel dança com Maria Alice Poppe, sua ex-aluna, que está no auge do seu vigor. A esse espetáculo de dança, que faz um contraponto sem clichês entre esses dois corpos, se agrega os textos de Simone de Beauvoir interpretados por Nathalia Timberg e Andrea Beltrão. Esses textos são livremente inspirados em entrevistas da autora, nos livros “A velhice” e “Uma morte muito doce”, em que a escritora escreveu sobre a morte da mãe. Realizado em parceria com a TSProductions, com quem a Taiga já co-produziu “Quase Dois Irmãos”, o filme conta com o apoio francês de Milena Poylo e Gilles Sacoud, responsáveis pela negociação com a Editora Gallimard, detentora dos direitos de Simone de Beauvoir. Créditos – Direção e roteiro: Lucia Murat – Baseado em textos de Simone de Beauvoir e no espetáculo “Qualquer coisa a gente muda” – Coreografia: João Saldanha – Produção: Lucia Murat, Milena Poylo, Gilles Sacuto, Celine Loiseau – Diretor de fotografia: Dudu Miranda – Diretor de arte: Cedric Aveline – Montagem: Mair Tavares e Marih Oliveira – Trilha Sonora: Sacha Amback – Edição de som: Simone Petrillo – Som direto: Jose Moreau Louzeiro – Mixagem: Emmanuel Croset – Colorista: Fabio Souza – Coprodução: TS Production. |
A memória que me contam (Trailer) Exibição: 21 de março às 19h pelo canal do NAVI Atores: Ana está morrendo. Ex-guerrilheira e um ícone da esquerda, ela é o último elo de um grupo de amigos que resistiu à ditadura militar no Brasil. Na sala de espera de uma casa de saúde, eles se reencontram. Utopias falidas, terrorismo e liberação sexual sob o ponto de vista de duas gerações, um grupo de ex-guerrilheiros e seus filhos, são os temas deste filme. Narrado como um quebra-cabeça, o filme mostra Ana apenas quando jovem, em flashback, como se ela nunca tivesse saído dos anos 60. Jovem , linda e perigosamente frágil. Créditos – Direção: Lucia Murat – Produção: Adrian Solar, Felicitas Raffo Julia Solomonoff e Lucia Murat – Produção Executiva: Daniel Lion, Denis Feijão e Martha Ferraris – Roteiro: Lucia Murat e Tatiana Salem Levy – Fotografia: Guillermo Nieto – Montagem: Mair Tavares – Direção de produção: Daniela Santos – Direção de arte: Ana Rita Bueno – Figurino: Inês Salgado – Som direto: José Moreau Louzeiro – Edição de som: Simone Petrillo – Mixagem: Emmanuel Croset – Música: Diego Fontecilla – Coprodutores: Bonfilm, Elixir Entretenimento, Locall, Universo Imagem. |
Homenageadas nas edições anteriores:
Mari Côrrea (2017)
Tizuka Yamasaki (2013)
Trinh Minh-ha (2010)
Jocy de Oliveira (2010)
Ana Carolina Teixeira Soares (2008)